Quando os recursos estão em múltiplos projetos
Estruturas complexas geram problemas exponenciais. Tudo era muito simples quando as empresas eram puramente funcionais, existia um chefe, um gerente e um diretor. Mas o mundo mudou, as empresas estão assumindo estruturas cada vez mais complexas e variadas, sem falar no conflito de gerações, necessidades e valores pessoais. Hoje discutiremos sobre como as empresas podem amenizar os problemas com o controle de alocação de recursos humanos compartilhados.
Segundo o PMBOK, além das estruturas projetizada e funcional, existem três tipos de estruturas matriciais: Forte, Fraca e Balanceada. Na Forte, os recursos são alocados no projeto sob a coordenação do GP. Na fraca, os departamentos recebem “demandas” e alocam os recursos internamente, o GP não coordena suas ações diretamente. Na Balanceada, acontece um pouco dos dois.
A principal vantagem da Estrutura Matricial é permitir que o GP arregimente recursos de vários departamentos e empresas parceiras. Já as principais desvantagens são duas: as prioridades dos departamentos de origem costumam se sobrepor às do projeto e a visibilidade sobre a capacidade dos recursos fica reduzida, ou seja, o GP não enxerga as atividades da equipe fora do projeto.
Embora os recursos sejam cedidos ao projeto, a “emoção” começa quando esses recursos também estão cedidos a vários outros projetos com prioridades variadas. É como uma Montanha Russa em que os assentos vão sendo ocupados acima da lotação máxima, alguém vai acabar se machucando!
Conflitos
Na estrutura matricial fraca, o recurso passa a ter muitos “chefes” e tarefas concorrentes. Por exemplo, pode vir a ser chamado a uma reunião de kickoff enquanto outro projeto está “pegando fogo”, um parafuso!
Se a priorização de negócio não estiver clara, com tanto paralelismo, o nível de comprometimento tende a reduzir e as entregas podem começar a falhar. O resultado disso é a proliferação de conflitos.
Empresas imaturas entregam-se aos conflitos, caça às bruxas (busca de culpados), atrasos, repriorizações ou simplesmente entregam produtos sem qualidade e entram no ciclo do retrabalho, empatando os recursos de entrarem em novos projetos. Como o que não é faturado também não é medido, esse ciclo tende a durar longos períodos sem ser percebido pela alta gestão.
Já as empresas mais maduras, percebendo que essa causa de conflito se deve à escassez de recursos e que isso não vai mudar, capacitam suas equipes e usam ferramentas para priorização dos projetos e acompanhamento de indicadores.
Operação x Projetos
Um caso bastante peculiar é quando os recursos técnicos trabalham tanto na operação quanto nos projetos. Honestamente, nunca vi uma implementação desse tipo funcionando adequadamente, os projetos são sempre prejudicados por atrasos e falta de comprometimento dos recursos.
Projetos com recursos escassos, abaixo do necessário, ou excessivamente compartilhados tendem a ter resultados ruins. O ideal é possuir uma equipe de projetos separada, ainda que seja terceirizada. Se possível, com especialistas de maior senioridade, que entreguem a “bola redonda” para o pessoal de operação.
Acontece que frequentemente as empresas entram no ciclo de retrabalho e acabam pagando o preço de ter que balancear operação x projetos, muitas vezes deixando essa responsabilidade na mão do profissional. Que tipo de resultado ele conseguirá entregar?
Capacitando a equipe
No final das contas, tudo depende do ser humano e são as atitudes, mais que as habilidades, que farão diferença. Preparar os profissionais para agirem de modo autônomo tem se mostrado eficaz em grandes empresas como IBM, Disney e Arno.
Observei dois princípios para a viabilização desse funcionário autônomo:
- Responsabilização (Accountability) – Cada pessoa é responsável e “responsabilizada” pelo trabalho que executa. Neste cenário, a palavra de um técnico tem “peso de assinatura”, ele é tanto responsabilizado por eventuais erros quanto reconhecido pelos acertos. Para que isso seja possível, ele precisa saber como seu trabalho é medido (metas), do processo que executa (como fazer) e do que pode ou não fazer (regras).
- Transferência de Poder (Empowerment) – Cada pessoa tem poder de decisão no âmbito das atividades que executa. Isto significa que tem capacidade e poder para tomar decisões relacionadas ao seu trabalho e que a empresa confia que suas soluções são viáveis (dentro de limites ou sistemas pré-estabelecidos). O alinhamento com seu gestor técnico deve ser total e é de responsabilidade do profissional.
As empresas do grupo Disney utilizam a autonomia dos funcionários como aliada há muitos anos, cada funcionário sente-se responsável pelo bem-estar dos “convidados”, modo como chamam os clientes. Além disso, a empresa sabe que a melhor forma de coletar a opinião dos clientes é diretamente, sobretudo por observação. Elas também garantem que as sugestões sejam encaminhadas e tratadas e premiam os funcionários que tiverem esse tipo de iniciativa.
Priorização de Projetos
A priorização dos projetos é o “pulo do gato” para controlar esse cenário. Prioridades devem ser estabelecidas segundo critérios. Até mesmo o modo “quem grita mais alto” pode ser tabulado e gerenciado. Tipicamente esses critérios devem ser transformados em valores numéricos, comparáveis e monitoráveis.
Se a prioridade de um projeto mudar, é preciso que todos os envolvidos sejam avisados imediatamente. É fundamental que o GP conheça a prioridade do projeto, para evitar prejuízos ao relacionamento com o cliente e à imagem da empresa. Os “Top 10 Projetos” devem ser de conhecimento de todas as áreas envolvidas e devem possuir clara prioridade sobre os demais.
Algumas empresas adotam o Gerente de Recursos Compartilhados, que é um papel responsável por entender as prioridades e disponibilizar os recursos para os projetos. Sua presença faz com que o GP se concentre em coordenar o projeto e tenha um ponto focal de escalada para problemas com recursos. Trabalhei numa implementação desse modo em duas empresas e o custo-benefício era compensador.
Controlando os recursos compartilhados
Não se trata apenas da montagem de uma planilha, a otimização da alocação de recursos (muito) compartilhados depende, acima de tudo, da atitude impressa nos funcionários e da habilidade dos gestores de priorizar projetos.
Mais importante que sair procurando métodos é conhecer o comportamento do negócio. Contrate uma consultoria de modelagem e descubra o quanto seu processo é controlável estatisticamente. Se os projetos não tiverem similaridade alguma, sugiro que use algum método empírico, ao invés de tentar padronizar o que não tem padrão.
Em todo caso, existem templates de controle (veja aqui) e modelos científicos como a teoria das filas, que trabalha cálculos de tempos-médios de demanda/atendimento (veja uma apostila aqui).
A matriz projetizada é muito rentável para os negócios, otimiza recursos e possibilita a expansão geográfica do negócio. Também pode aumentar a capacidade produtiva momentaneamente, quando se trabalha com terceirizados. Pode funcionar em diversas configurações dentro das variáveis recursos, ferramentas e prioridades. E cada caso deve ser estudado em detalhes antes de se definir um modelo de estrutura organizacional.
Eli Rodrigues
Bibliografia
- AVILA, Francisco. PEREIRA, Rodrigo. Gestão autônoma da produção: os benefícios da implantação numa empresa multinacional do setor de pneumáticos http://www.aedb.br/seget/artigos08/467_467_Gestao_autonoma.pdf
- BUZZETO, Carlos. O papel da liderança no desenvolvimento de equipes autônomas de produção. http://www.administradores.com.br/informe-se/producao-academica/o-papel-da-lideranca-no-desenvolvimento-de-equipes-autonomas-de-producao/609/
- MACEDO, Ivanildo et al. Aspectos comportamentais da gestão de pessoas. Editora FGV. 9ed rev. e atual. 2007.