Não queremos pessoas produtivas em nossa empresa!
Todos sabemos que seres humanos preferem viver em grupos, caso contrário não haveriam cidades abarrotadas de gente. Também se sabe que costumam imitar uns aos outros, por isso pensamos, agimos e nos vestimos como aqueles com quem nos identificamos. Mas por que isso ocorre?
Os primatologistas têm uma explicação interessante, dizem que os primatas agem de forma parecida para protegerem-se dos predadores. Se observarmos documentários de primatas vigiando seu território veremos que são extremamente parecidos com soldados vigiando o perímetro de um acampamento de guerra. Mas não só os primatas agem assim, todos os animais que buscam a proteção do grupo submetem-se às suas regras, é algo que se manifesta instintivamente, especialmente nos mamíferos. Se agirem de forma similar saberão quem são os inimigos, ou seja, quem ameaça o status quo.
Nós humanos agimos exatamente como estes animais, buscamos proteção e aprovação do grupo para nos sentirmos seguros. Isso acontece na família, nas empresas, nos grupos de amigos e é bem evidente em grupos de interesses como: ciclistas, executivos, religiosos etc.
Essa identidade de grupo, no entanto, tem um lado negativo. Ela nos leva a criar preconceitos, que nada mais são que mecanismos de defesa sobre aqueles que agem de forma diferente. Pense comigo, se formos ciclistas nos uniremos em repúdio aos motoristas que invadem as ciclovias; se formos enxadristas, acharemos que os que gastam horas na academia são menos inteligentes e se formos “ratos de academia”, acharemos que apenas nós estamos cuidando realmente da saúde. Essa identidade pode se tornar tão forte a ponto de causar rupturas sociais e as guerras são ótimas alegorias para observamos o comportamento coletivo face a um propósito e um inimigo.
Nas empresas funciona da mesma forma, os que chegam cedo reprovam os que saem tarde, os que usam roupa social reprovam os que usam roupas casuais e aqueles que se esforçam demais são vistos pelos colegas como “alpinistas de carreira”, indignos do convívio do grupo. Tudo isso acontece sem que percebamos que são apenas nossos instintos de proteção nos fazendo agir sem pensar e quando uma opinião encontra abrigo no grupo se estabelece uma crença.
Tenho visto uma quantidade significativa de pessoas desistirem de empregos porque não se adaptaram. Por que isso ocorre? Simples, porque vieram de outros grupos e se sentem ameaçados pela mudança, especialmente se não tiverem nenhum apoio, por isso preferem buscar grupos com os quais se identifiquem mais ao invés de lutar por seu espaço. Sendo ainda mais simplista, todo ser humano normal leva em média 3 meses para se adaptar em um novo emprego, não é verdade? É o tempo que leva para desprender-se das crenças que trouxe de empregos passados e adaptar-se às novas, daquele grupo.
O problema, descoberto lá em 1920 e poucos na experiência de Hawtorne, é quando um funcionário mais interessado em ser produtivo, seja lá qual for sua razão, desperta o sentimento de ameaça nos demais colegas, iniciam-se as “piadinhas”, as acusações de bajulação e favoritismo. Já vi muitos bons funcionários perderem o ritmo e a disposição apenas para “agradar” aos demais, que estão numa condição estável e não têm interesse em “mostrar serviço”.
Livrar-se desses “caipiras organizacionais” e mudar a cultura da empresa não é fácil, muitos resistirão bravamente à mudança, principalmente os “líderes informais”. A mudança nunca será agradável e sempre trará insegurança, duvidamos de nossa própria capacidade de adaptação, será que conseguiremos sobreviver ao novo mundo?
Acontece que o mundo, as empresas, os grupos e as pessoas estão sempre mudando. As motivações são várias, pode ser uma nova filosofia de gestão, um concorrente mais agressivo, um novo equipamento, uma nova técnica, assim como podem ser situações mais drásticas como guerras, catástrofes naturais, surtos de doenças etc. Será que a mera chegada de um colega melhor capacitado ou com maior vontade de “realizar” é motivo para nos protegermos? Será que devemos deixar nossos instintos guiarem nossas ações, palavras e pensamentos? Devemos nos unir em revolta às mudanças, à autocracia, às injustiças? Será que estamos enxergando claramente ou nossos medos estão nos levando à dissonância cognitiva?
Como gestor, tenho identificado e apoiado funcionários dispostos a trabalhar a “milha extra”, são esses que trarão novas ferramentas, novas técnicas e novas perspectivas. Àqueles que permanecem presos a um comportamento antigo, costumo apresentar a mudança como alternativa, como um caminho melhor, ajudando-lhes a perceber que são capazes e que não precisam temer.
Se deixarmos, os “caipiras organizacionais” sempre gritarão em grupo o lema: “Não queremos funcionários produtivos em nossa empresa”, assim se sentirão novamente no controle, expurgando esses super-heróis que brotam de vez em quando. Se desejamos construir equipes de alto desempenho, precisamos ter em mente que a entrada de qualquer nova pessoa representa um “trauma” para o grupo. Chamo de trauma, pois irá desestabilizar o status quo e trazer a necessidade de reorganização. Alguns perderão influência, outros ganharão espaço e uma nova configuração se estabelecerá naturalmente.
Esse processo natural precisa ser monitorado, evitando que o novo funcionário “murche” e se torne “mais um”. Aos que preferem permanecer na média cabe a mediocridade, por isso, toda empresa deve premiar seus talentos e de tempos em tempos, expurgar aqueles que não desempenham a contento. Quero dizer com isso que a produtividade não deve ser mensurada pela média, mas pelos extremos. Precisamos entender quanto o contexto têm influenciado o comportamento individual e como isso impacta as metas de trabalho, só então formaremos equipes com o que há de melhor e não pelo que há de pior.
Eli Rodrigues
Realmente, vivi esse fator de repúdio pela vontade de realizar, em um grupo que estava querendo manter o status quo.