Os papéis do Scrum e suas facetas
O porco e a galinha
Muito se discute sobre os papéis e responsabilidades das pessoas comprometidas (e envolvidas) num projeto Scrum e para começar a explicação, vale relembrar a velha estorinha do porco e da galinha:
A galinha (envolvida) dará seus ovos para construir o restaurante, enquanto o porco (comprometido) terá que dar sua carne.
Essa piadinha antiga demonstra que num projeto há pessoas que têm responsabilidade pelo resultado do projeto e outras que apenas participam. Sendo mais direto: Se o projeto não der certo, você será demitido ou, na verdade, você apenas participou dando sugestões?
Um exemplo para ilustrar:
Jonathas, Pedro e José são programadores de um único projeto. Seu trabalho é construir um aplicativo mobile dentro de determinado escopo e parâmetros de qualidade. Como é um projeto Scrum, há um prazo estimado, mas a velocidade do time dependerá do acompanhamento diário para gerar uma projeção mais realista de prazo. Isso, é claro, se não houver impedimentos pelo caminho que impactem nessa velocidade.
Carlos é o Scrum Master. Ele dedica todo seu tempo, da hora que acorda até dormir, pensando no projeto. Seu trabalho é proteger a equipe de intervenções externas e garantir que o escopo (estórias) de cada sprint virem realidade toda sexta-feira.
Manuel é o PO do projeto. Ele vendeu a ideia internamente na empresa, conseguiu a verba para fazê-lo e tem uma visão bem clara de onde deseja chegar. Suas metas são atreladas ao resultado daquele produto que, quando pronto, deverá economizar 5 milhões para sua empresa. Se tiver sucesso, será promovido. Se fracassar, será demitido.
Miguel, Orlando e Roberto são do departamento de marketing. Eles adicionaram várias ideias ao projeto. Pretendem utilizar o app quando ficar pronto para fazer uma campanha publicitária e foram provedores de 30% do orçamento. Se tudo der certo, vai ser ótimo para eles, mas se não der… coitado do Manuel… que não entregou.
Pois é, alguém tem que pôr o pescoço na mesa para garantir que algo dê certo. E nesse caso, seriam a equipe, o Scrum Master e o PO. Os demais são apenas envolvidos (partes interessadas ou stakeholders, como preferir).
Essa separação é importante para as explicações que virão a seguir.
Por que os papéis do Scrum existem?
A figura abaixo ilustra os papéis citados na parte anterior. Observe a separação, os envolvidos ficam fora das decisões do projeto, eles apenas influenciam e sugerem. É claro que um envolvido superpoderoso será capaz de impor sua opinião, mas essa gestão política é exatamente trabalho do PO.
Com um único PO, o projeto tem apenas um objetivo, um conceito, um senso de prioridade e de qualidade. O Scrum Master e a equipe podem abstrair toda complexidade das discordâncias normais que existem em grupos de pessoas e enfocarem-se apenas em executar o combinado o melhor possível.
Um projeto pode ter mais de um PO se estiver construindo vários produtos, o que alguns chamam de sub-POs. Mas quando há mais de um PO sobre o mesmo produto, a complexidade política recai sobre o Scrum Master (e por consequência sobre o time) e a produtividade cai.
É como um jardineiro que recebe a missão de podar as árvores do jardim sul e, quando está lá, recebe ordens para regar as plantas do jardim leste. Ao chegar lá, leva uma bronca porque ainda não cuidou das flores do jardim norte e assim por diante, perde-se o senso de prioridade.
Será possível que duas ou mais pessoas concordem com requisitos, parâmetros de entrada (definition of ready) e de qualidade (definition of done)? É claro que sim. Desde que as regras sejam combinadas no início do jogo e que a visão do produto seja a mesma entre todos. Particularmente, nunca vi funcionar.
Continuando na análise da figura, observe que o Scrum Master está junto com o time e que todos eles têm interface com o PO. O SM atua como um facilitador, ele orienta o uso do processo, reporta os status, mede velocidade e negocia com o PO. Mas o time inteiro participa das estimativas, da definição de atividades e das estimativas.
Logo, se um projeto recebe estimativas “de cima pra baixo” não está usando uma das grandes vantagens do Scrum, que é o comprometimento do time com o resultado. Afinal, eles se comprometem porque discutiram a solução e porque eles próprios estimaram o projeto.
Papéis do Scrum
Product Owner
- Representante do Cliente
- Ponto focal das demandas
- Entende do negócio
- Define a visão e requisitos do produto (escreve as estórias de usuário)
- Define prioridades
- Decide o que faz parte do projeto
- Responsável pelo aceite das entregas
Scrum Master
- Garante a comunicação da equipe
- Garante que o Scrum seja seguido
- Remove impedimentos
- Protege a equipe de interferências externas (garantir produtividade)
- Facilita/ modera as reuniões diárias
- Auxilia na priorização dos requisitos
Scrum Team (Time ou Equipe)
- É composto pelas pessoas diretamente ligadas ao projeto
- Garante que o projeto seja entregue com todas as funcionalidades necessárias
- Participa da definição do objetivo da Sprint
- Faz aquilo que é necessário dentro das diretrizes do projeto para alcançar o objetivo da Sprint
Confusões de papéis e suas consequências
Quando um PO não tem autonomia para definir (e aprovar) o projeto, há retrabalho e perda de produtividade. A equipe terá uma definição do PO que depois poderá ser desaprovada e acabará perdendo o engajamento.
Quando um Scrum Master não resolve impedimentos ou ignora a definition of ready, aceitando requisitos que ainda não estão prontos para trabalhar, perde-se produtividade.
Quando o time não participa da discussão técnica e nem da estimativa, não se tem comprometimento com o resultado (É como seu chefe lhe dizer o tempo que você levará para fazer uma tarefa sem ter real noção do tempo necessário).
Os papéis do Scrum são muito bem desenhados. Note:
Uma pessoa retém toda complexidade da organização para dar uma visão única ao produto. Essa mesma pessoa determina o que será feito, em que ordem e como a qualidade será avaliada. Ela também escreve exatamente como espera que as coisas sejam implementadas, essa pessoa é o PO.
Outra pessoa planeja o que será feito a cada ciclo, verifica se todas as premissas necessárias estão presentes (definition of ready) para começar o trabalho e garante que o time participe da estimativa, dê status diários (daily meeting) e aponte seus impedimentos, os quais ela própria deverá resolver. Este é o Scrum Master.
Por fim, um grupo de pessoas tem apenas uma preocupação: Produzir. Todo trabalho já foi priorizado, toda discussão técnica já foi realizada, todas as necessidades estão presentes e, se algo impedir o trabalho, sua única preocupação é apontar para o Scrum Master. Esse é o Scrum Team.
É muito óbvio que esse ciclo de trabalho seja altamente produtivo, mas para tal, é preciso que cada papel exerça suas responsabilidades. Se um deles falhar, todo ciclo falhará. Se apenas um “elo da corrente” estiver desalinhado, a corrente quebrará e, com ela, todas as vantagens que se espera obter com o uso do Scrum.
E tenho dito!
Eli Rodrigues