Uma reflexão sobre o comportamento organizacional americano
A idéia do contato com outros povos me faz lembrar da (não tão) remota época em que o transporte era lento e caro. As pessoas viajavam a cavalo, de carroça ou navio, levavam dias para chegar a qualquer lugar que hoje chegamos em horas. Naquela época, somente os “peregrinos” eram portadores das histórias sobre outros povos, talvez por isso fosse tão mais fácil encontrar gigantes, feras e todo tipo de aventura (A comunicação boca-a-boca costuma modificar os fatos, como na brincadeira do “telefone sem fio”).
Hoje o mundo é mais rápido, mais complexo e muitos mitos foram extintos. Já conhecemos tudo que há no globo, basta entrar no google world ou pesquisar na internet sobre qualquer cultura, povo ou lugar. Mas apesar de toda essa disponibilidade, a maioria de nós prefere continuar sem “empatia”, preferindo olhar o mundo sempre pela cultura natal ou pelo que é simpático, perdendo a chance de conhecer um mundo de opiniões e experiências diferentes.
Quero escrever hoje sobre o “Comportamento Organizacional” do povo americano, com quem tenho remotamente convivido há quase um ano, para compartilhar algumas lições que tenho aprendido com eles:
- Objetividade não é estupidez – No ambiente de trabalho, americanos iniciam uma conversa com um “good morning” e em seguida pedem o que precisam. Não seguem o procedimento considerado como educação no Brasil, de sempre cumprimentar antes (“Bom dia, tudo bem? como vai a família? está ocupado? você poderia me fazer um favor? preciso de tal coisa, pode ser?”). No começo pode parecer um pouco estúpido, mas quando você é envolvido em vários projetos e tem pouco tempo, a objetividade ajuda bastante.
- Pedir ajuda e agradecer – Mesmo que seja sua obrigação fazer determinada atividade, costumam pedir como se fosse uma “ajuda”, e sempre agradecem ao final. É sempre agradável receber um “Obrigado” por algo que você se empenhou para fazer.
- O combinado não é caro – Entregar o que foi pedido e seguir os processos é a regra, as exceções devem ser tratadas como tais. Deste modo, todos sabem o que esperar uns dos outros. Não tem o jeitinho brasileiro, aquele ímpeto de tentar dar jeito pra tudo, mesmo o que não é sua responsabilidade.
- Foco em resultados – Monitorar o resultado dos trabalhos é mais produtivo que monitorar as pessoas. Nesse tipo de ambiente, se você entregar os serviços dentro dos parâmetros especificados, será reconhecido. Não importa se o “chefe” gosta ou não de você.
- Respeito a disponibilidade alheia – As pessoas se programam para cumprir as reuniões marcadas, logo, os horários devem ser cumpridos a risca – tanto de inicio quanto final. E se precisar acessar alguém fora de uma reunião, é de “bom tom” perguntar sua disponibilidade para falar.
- Reunião não é happy hour – As pessoas tem outras atividades para fazer, não convém prendê-las em reuniões sem objetivo. Toda reunião deve ter objetivo, pauta e ata. Geralmente usa-se 2 a 3 minutos para um quebra-gelo e em seguida, tratam-se objetivamente os pontos planejados.
- E-mail substitui reuniões – Muitas coisas podem ser resolvidas por e-mail, isso facilita bastante a comunicação assÍncrona. Nas mail threads é possível acompanhar todo histórico de uma discussão sem burocracia. Para eles e-mail é documento e pode ser encaminhado a qualquer pessoa, portanto muito cuidado com o que irá escrever.
- Escalar não é brigar – Se uma pessoa não faz seu trabalho, seja qual for o motivo, ela é escalada para seu gerente imediato. Este irá avaliar as razões e se posicionar de forma a prover uma solução ao projeto/ manter a fluidez dos trabalhos. No Brasil a escalada é mal vista e gera retaliações.
- Cada macaco no seu galho – Cada profissional tem sua função e responsabilidade e faz somente isso, nada a mais nem a menos. Pode parecer medíocre para os “ativistas da proatividade”, mas como coordenar atividades se uma pessoa tentar fazer a atividade da outra? Os resultados costumam ser indesejáveis.
- Metas e regras claras – Todos sabem o que deve ser feito, quando, por quanto e com que qualidade. Se for uma empresa meritocrática, as pessoas naturalmente se motivam a fazer seus trabalhos e sentem-se realizadas por isso.
As diferenças culturais são muitas e não ouso analisar as raizes sociológicas. Atenho-me a perceber, descrever e adotar o que for útil, mas devo admitir que uma cultura que premissa o resultado e a responsabilidade individual, propicia um crescimento muito mais rápido do que a baseada em paternalismo e exploração.
Se quiseremos consolidar o Brasil como um potência mundial nas próximas décadas, precisamos começar a mudança cultural desde já. Se continuarmos deixando tudo para última hora, como os Estádios da Copa e tantas outras coisas, que qualidade nossos trabalhos terão? Da mesma forma, enquanto a Lei de Gérson for pedra angular da nossa cultura, não chegaremos a lugar algum. Nos livraremos dos Jeca Tatus, Bem-amados e Macunaímas?
As respostas virão com o tempo, por enquanto cabe a cada um mudar a si próprio, através da empatia, do confronto e da diversidade cultural. Quem sabe seja verdade que “de grão em grão a galhinha enche o papo”, se for, em breve teremos mudado o suficiente para garantir nosso espaço na economia mundial, sem transformar o Brasil inteiro numa imensa plantação de Soja.
Eli Rodrigues
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Hoje o mundo é mais rápido, mais simples e muitos mitos foram extintos. Já conhecemos tudo que há no globo, basta entrar no google maps/street/world ou pesquisar na internet sobre qualquer cultura, povo ou lugar. Mas apesar de toda essa disponibilidade, a maioria de nós prefere continuar sem “empatia”, prefere olhar o mundo sempre pela sua cultura natal e com isso perde a chance de conhecer todo um novo mundo.
Quero falar hoje sobre “Comportamento Organizacional” do povo americano, com quem tenho remotamente convivido há quase um ano. Meu conceito sobre esse povo era completamente diferente do que é hoje e gostaria de compartilhar com vocês algumas lições que tenho aprendido com eles:
Fico impressionado com a maneira que expôs a ideia, de maneira simples e direta, facilitando muito o meu entendimento do assunto: Excelente post.
Temos muito o que aprender com a cultura americana.
“Objetividade não é estupidez” e “Reunião não é Happy Hour” são ótimas lições que melhorariam muito o resultado das ações no trabalho.
Forte Abraço!
Olá Eli informações muito valiosas no seu post.
Vou comentar alguns dos itens:
* Objetividade não é estupidez – Já ouvi amigos meus dizendo que começam a fazer isso em casa, com as esposas. Ou seja, aquele ‘floreio’ na hora de uma conversa familiar, não pode (e nem deve ser esquecido). Então, entenda e avalie o ambiente onde está e as pessoas com quem vai interagir e veja a melhor maneira de fazê-lo.
* E-mail substitui reuniões – Muitas vezes um pouco de emails e uma reunião (+ rápida) para fechamento do assunto, costuma ser uma boa abordagem. O email evita discussões muito longas e a reunião garante o alinhamento.
* Escalar não é brigar – Vejo gente com receio dos escalations. Mas este, no meu entendimento, é um procedimento normal quando se chega a um impasse ou então quando se faz necessária a intervenção de uma instância superior.
* Cada macaco no seu galho – Com certeza, cada um no seu galho. Entretanto, alguns esquecem que os galhos são da mesma árvore, ou seja, que todos podem estar conectados por um eixo central (ex: o objetivo do projeto). Assim, a ação de um pode (e normalmente vai) afetar os demais (e a si mesmo).
* Metas e regras claras – Temos que ser SMART. Cada um sabendo exatamente o que precisa fazer e onde deve chegar, bem como, seu ‘raio de ação’ e autoridade.
Abraço,
/Giovani